terça-feira, 18 de janeiro de 2011

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12/01/2011
 às 6:00 \ Direitos HumanosEUATerrorÁsia

Pra não dizer que não falei de flores

Rosas para o Assassino - Foto Miar Khursheed/ Reuters
Existe uma imensa distância geográfica, política e cultural entre as cidades de Islamabad, no Paquistão, e Tucson, no estado americano do Arizona. Mas, em comum, na primeira semana de janeiro, ambas foram palcos de terríveis tragédias. As vítimas foram dois políticos moderados, conhecidos pela defesa da tolerância, e preocupados com o clima de envenenamento ideológico e polarização em seus respectivos países. No Paquistão, Salman Taseer, baleado e morto. Nos EUA, Gabrielle Giffords, baleada e que luta por sua vida no hospital.
Vamos começar pelo mais distante Paquistão, embora seja mais fácil explicar o que aconteceu e o que pode ainda acontecer de pior por lá. As raízes do extremismo se disseminam rapidamente em um dos países mais instáveis e explosivos do mundo. Isto ficou ainda mais óbvio com o assassinato de Taseer, governador da província de Punjab, por um integrante de sua própria equipe de segurança, enquanto os demais apenas olhavam a saraivada de 26 tiros.
Taseer era uma voz corajosa contra o radicalismo islâmico e sua morte foi mais uma prova de como este extremismo está nas entranhas do corpo político,  do sistema judicial e do aparato militar e de segurança, sem falar de organismos mais óbvios como mesquitas e madrassas (as escolas religiosas).
O policial Malik Qadri é um fanático religioso que ficou enraivecido com a oposição do corajoso governador contra as leis de blasfêmia. Taseer estava engajado na defesa, em uma proeza quixotesca, de uma camponesa cristã e analfabeta, acusada de insultar o profeta Maomé e o islamismo, crimes capitais com base nesta legislação implantada em 1980 pelo então general-ditador Mohammad Zia ul-Haq, que promoveu a islamização do  estado e da sociedade para unir o país e ganhar pontos políticos.
O ditador acelerou o afastamento do Paquistão do sonho do líder da independência, Ali Jinnah, de criar uma nação secular, democrática, multiétnica e multirreligiosa para os os muçulmanos do subcontinente indiano, depois do fim do domínio colonial britânico em 1947.  Hoje, o cenário é muito desolador. O Paquistão, país com um crescente arsenal nuclear e um governo cambaleante, é santuário de grupos extremistas e terroristas, como o Taliban e Lashkar e-Taiba, patrocinados pelas forças de segurança com o objetivo estratégico de impedir a estabilidade no Afeganistão e manter as tensões com a índia. Políticos e militares cortejam os partidos islâmicos e nunca reagem com o vigor necessário contra os radicais, apesar das pressões americanas.
O temor é que  material nuclear chegue às mãos de terroristas islâmicos ou que o Paquistão simplesmente se consume como um Estado falido. O assassinato de Salman Taseer foi chocante, assim como é a lei de blasfêmia. Também chocante foi a reação. A elite política se acovardou, centenas de clérigos expressaram apoio ao assassinato e advogados estão entusiasmados para fazer a defesa do suspeito, não tanto por achar que qualquer um seja inocente até prova em contrário, mas por considerá-lo o paladino de uma causa justa.
Pelo mundo correu a imagem da chuva de pétalas de rosa saudando um inimigo da tolerância quando ele chegou  ao tribunal,  sorrindo e em uma atitude de desafio.  Aliado ambíguo dos EUA e do Ocidente na luta contra o terror, o Paquistão pode ter agora cruzado uma fronteira ainda mais perigosa. Existe este vigor dos islamistas para cimentar a sharia (lei religiosa) dentro de casa e exportar a jihad. O Paquistão dá mais um passo rumo ao abismo. 
Não é à toa que numa pequisa com especialistas em terrorismo na revista Foreign Policy, Andrew Exum não tenha seguido a boiada apontando Osama bin Laden como o mais perigoso terrorista do  mundo. Ele advertiu que é o extremista anônimo que pode precipitar uma guerra entre a Índia e o Paquistão, com mais um atentado ao estilo do de Mumbai em 2008.

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